É fulcral uma análise intricada sobre as relações entre lÃngua, texto e
sujeito uma vez que as reflexões sobre o funcionamento da lÃngua não se separam
da noção de sujeito que temos.
(MARCUSCHI, 2008 p.68) Com essa
perspectiva, analisaremos as três principais concepções de lÃngua e como esse
conceitos podem conduzir as atividades de compreensão textual nos livros
didáticos de LÃngua Portuguesa (LDP).
Num primeiro cenário do pensar a
lÃngua, ela era tida como uma representação do pensamento e/ou uma estrutura de
pensamento. Desse modo, desvincula-se a lÃngua de seus aspectos mais
importantes – histórico e social. Nessa perspectiva, o sujeito-autor exerce
total domÃnio sobre o sentido do texto, sendo assim, um pensamento bem
representado produzia, certamente, um texto bem compreendido. Tornando nula a
participação do sujeito-leitor na construção do sentido. Dessa maneira, o texto aparece como uma
expressão do pensamento. Apesar
da base filosófica, esses antigos conceitos de lÃngua texto e sujeito ainda
norteiam algumas práticas docentes. E, consequentemente, conduzem as atividades
de compreensão textual nos LDP. Um exemplo dessa abstração pode ser visto em
perguntas do tipo: O que o autor quis
dizer? O que significa esta obra? Como
dito, proposições como essas sugerem que
o texto reflete integralmente a intenção do sujeito-autor (dono do sentido).
Sobre essa problemática, Koch (2002) afirma que o sujeito, para essa concepção,
é “dono de sua vontade e de suas ações”. Porém, faz-se necessário afirmar que a
própria lÃngua é sensÃvel “à realidade sobre a qual atua, sendo-lhe
parcialmente prévio e parcialmente dependente esse contexto em que se situa.”
(Idem, p.61). Num segundo momento
histórico, a lÃngua era pensada como uma junção do código e estrutura, trazendo
o texto como mero produto advindo da codificação efetuada pelo emissor. Sendo
assim, o poder do sentido encontra-se na própria superfÃcie textual fazendo dos
sujeitos simples emissores e/ou receptores. Nela, estarão – hipoteticamente- todos os possÃveis
sentidos dos textos que serão decodificados pelo receptor, dominante do mesmo
código. Logo, apresenta-se uma similaridade com a concepção de lÃngua
anteriormente apresentada, pois ambas desprezam o contexto
sócio-historico-cultural-usual. Sobre isso, Marcuschi
(2008 p.60) postula:
“quanto à perspectiva que trata a lÃngua como instrumento, a posição não parece razoável pelo fato de não atingir nenhum nÃvel de abstração desejável pelo fato de desvincular a lÃngua de suas caracterÃsticas mais importantes, ou seja, seu aspecto cognitivo e social. Além disso, tem como conseqüência a idéia de que a lÃngua é um instrumento transparente e de manuseio não problemático. A compreensão se torna algo objetivo e a transmissão de informações seria natural. Essa perspectiva é pouco útil, mas muito adotada, em especial pelos manuais didáticos, aos tratarem os problemas da compreensão textual. Essa posição é muito comum nas teorias de comunicação em geral. É uma das visões mais ingênuas.”
Alguns autores que enxergam a lÃngua como código compartilhado chegam a
formular maneiras descontextualizadas de se fazer sentido em qualquer lÃngua
natural. O sujeito-autor é tido como remetente, o sujeito-leitor é denominado
destinatário e o texto chama-se mensagem.
No exemplo que se segue, podemos visualizar a noção de texto que prioriza
a superfÃcie textual; os aspectos estritamente linguÃsticos e o sujeito como
lançador do sentido – também chamado de emissor- e leitor como decodificador do
código compartilhado, bem como a de lÃngua como código em um exercÃcio do LDP
intitulado Linguagens, Códigos e suas Tecnologias:
Figura 1. ExercÃcio de LÃngua Portuguesa numa perspectiva lÃngua-código.
É importante reconhecer que os autores dos LDP que seguem essa
perspectiva fazem uso de um relevante número de trabalhos em compreensão
textual. Porém, o “problema não é a ausência deste tipo de trabalho e sim a natureza do mesmo” (MARCUSCHI, 2001).
Nessas atividades, a leitura e compreensão é uma atividade linear focada no
texto na qual “tudo está dito no dito” (KOCH e ELIAS, 2010 pg.10).
Por
último, temos uma visão interacional (dialógica) da lÃngua, na qual os sujeitos
são vistos como atores/construtores sociais. Distinto das perspectivas
anteriores, o sentido do texto passa a ser construÃdo pelo homem social, pois o
texto é resultado de um constructo da relação do eu com o outro. Percebemos,
então, um grau de responsabilidade mutável e negociável entre quem lê e entre
quem produz algo passÃvel de leitura. Dessa forma, não há como dissociar texto
de contexto histórico-social.
Nessa vertente de pensamento linguÃstico, não se deixa de admitir que a
lÃngua seja um sistema simbólico, contudo ela tomada como um atividade
sociointerativa desenvolvida em contextos comunicativos historicamente
situados. (MARCUSCHI, 2008.p.61)
No Brasil, apesar de ainda termos inúmeros docentes com uma antiga visão de lÃngua
– muitas vezes devido a fatores como a não atualização dos conhecimentos da
grande área de Letras, outras por não realizar formação continuada, e às vezes
por achar mais cômodo-, podemos afirmar que, hoje em dia, a maioria dos LDP
(sobretudo das escolas públicas) é produzido com essa defesa da
lÃngua-dialógica. Com isso, os exercÃcios do LDP concebem a relação trifásica autor-texto-leitor.
Como demonstraremos no exemplo abaixo:
Figura 2: ExercÃcio
de LÃngua Portuguesa numa perspectiva dialógica-interacionista.
Fonte:
Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro. DisponÃvel na Internet.[2]
Com esse tipo de pensamento, os alunos estabelecerão um maior grau de importância aquilo que de fato se lê, e poderão usar essas leituras em todos os outros ambientes comunicativos – não somente em espaços fÃsicos e formais de aprendizagem.
REFERÊNCIAS
MARCUSCHI, L.A. Compreensão de Texto: algumas reflexões.
In: DIONISIO,A.P. e BEZERRA, M.A. (Orgs.) 2001. O Livro Didático de Português: múltiplos olhares. Rio de Janeiro,
Ed. Lucerna.
MARCUSCHI,L.A. 2008. Produção
Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São Paulo, Parábola.
KOCH, I.V. e ELIAS, M.V. 2010. Ler e Compreender os Sentidos do Texto. São Paulo, Editora Contexto.
KOCH, I.V. e ELIAS, M.V. 2010. Ler e Compreender os Sentidos do Texto. São Paulo, Editora Contexto.
[1] DisponÃvel em: < http://www.objetivo.br/arquivos/revisao_bimestral/extensivo/2011/D/tarefa/revisao2_extensivoD_portugues_tarefa.pdf
> Acesso em 15 de outubro de
2014.
[2] DisponÃvel em <http://www.portugues.seed.pr.gov.br/arquivos/File/livrodidatico.pdf>
Acesso em 16 de Outubro de 2014.
[3] O
presente termo CrÃticos Conservadores da
MÃdia faz referência a uma entrevista concedida pelo linguista Marcos Bagno
ao Jornal Universitário do Pampa. Nessa entrevista, o lingüista também cita
nomes de alguns desses conservadores, dentre eles está o do famoso gramático
Pasquale. DisponÃvel em <http://www.junipampa.net/2013/01/entrevista-exclusiva-com-marcos-bagno.html.>
Acesso em 17 de outubro de 2014.
Nenhum comentário:
Postar um comentário